No fim de outubro, fez um mês que passei por uma cirurgia na base do seio direito. Estava com uma lesão em um encontro de cicatrizes de cirurgias anteriores, quando tive câncer no seio por três vezes e fiz duas quadrantectomias e uma mastectomia.
Confesso que quando vi a necessidade de uma biópsia e depois da cirurgia fiz a pergunta: "E agora, o que eu tenho que aprender?"
Vivi alguns momentos de falta de tranquilidade, mas não me fixei neles.
Deixei fluir e exercitei a ENTREGA mais uma vez. De repente, era como se uma calma interior se estabelecesse dentro de mim e nada mais importasse. Era como deixar de fazer foco no problema que surgiu de forma inesperada e olhar novamente para a necessidade de me cuidar, mais uma vez, mas sem atropelos.
Embora a biópsia tenha dado negativa, a cirurgia acabou sendo maior do que se imaginava, pois, atrás da lesão, havia um cisto com infecção dentro. Isso fez com que a área retirada tivesse que ser maior.
Todos os passos que antecederam a tomada de decisão da cirurgia foram feitos com muita conversa, explicações claras e tentativas de encontrar caminhos menos invasivos junto com minha a Dra. Patrícia Valentini de Melo, da Choice Medicine. Cada etapa teve uma escolha: na primeira, a utilização de uma pomada antibiótica por poucos dias, depois o antibiótico via oral em uma dosagem alta, porque a pomada havia surtido efeito, mas não o suficiente. Depois, a raspagem do local para biópsia e, por fim, a cirurgia. Era a formação de uma gordura necrosada, que, se não fosse retirada, poderia ficar voltando.
Mas por que contar estas etapas em detalhes? Porque em cada etapa havia uma ESCOLHA em que participei de forma CONSCIENTE E ATIVA junto com minha médica e amiga Dra. Patrícia. Aliás, esta reflexão surgiu após uma consulta de avaliação. Nossas trocas sempre resultam em aprendizados mais profundos.
Com a cirurgia, tive que parar por um mês de praticar ioga, que me faz muito bem. Tive que aprender a entender o tempo de cura, porque, como já não tinha dor, movimentava o braço direito mais do que poderia e começou a inchar no local da cirurgia. Tive que voltar a atenção para mim novamente, frear e me cuidar.
Explicar com detalhes o processo físico me ajuda a enxergar nas entrelinhas os efeitos emocionais e espirituais neste desafio que a VIDA mais uma vez me apresentou.
Desafio pequeno se comparado aos anteriores, mas que testou em mim algo que comentei no meu livro Chama Acesa e que ainda não tinha vivido: "e se o câncer aparecesse de novo, como reagiria?". Eu respondi na época que, se acontecesse, teria que exercitar a entrega e que haveria um motivo.
A possibilidade de ser uma recidiva era pequena, mas existiu. E eu tive a oportunidade de viver tudo que escrevi no livro, sem exceção. Agora, vamos para as reflexões e aprendizados desta situação.
Neste caminho evolutivo, eu sempre doei com muita facilidade, ou seja, pelo meu perfil, sempre foi mais fácil cuidar de alguém do que me cuidar.
Para algumas pessoas, acontece o contrário, aprendem a se cuidar primeiro para depois aprenderem a cuidar do outro.
E novamente, sem julgamento, é o caminho de cada um, de acordo com perfil, habilidades e desafios, que fazem parte da vida de todos nós.
Quem leu o livro Chama Acesa pode ver com detalhes como foi este meu caminhar com todos os obstáculos e conquistas. O primeiro aprendizado foi aprender o que é cuidar verdadeiramente do outro.
Tive que desaprender muitas coisas para perceber que cuidar verdadeiramente é respeitar a escolha do outro, mesmo que perceba que não seria a melhor opção de acordo com a sua visão e bagagem de experiência; é aprender a amar incondicionalmente, pois o vinculo afetivo é o que garante a proximidade de alma com qualquer pessoa e também apoiar ajudando-a a buscar dentro de si mesma o que faz sentido para ela. Não existe receita, nem conselho, pois o que é bom para uma pessoa pode não ser para a outra.
Deixar que o outro erre e acerte, como eu errei e acertei para aprender. E isto não é nada fácil, porque recebemos, em nossa educação, mensagens implícitas de que cuidar é superproteger e impedir que o outro sofra.
A dor nos leva a olhar para dentro e a aprendizados significativos. Esses aprendizados nos ajudam a evoluir, a ganhar força. E não temos o direito de interferir ou impedir que cada um viva a sua experiência. Mas preciso afirmar que demorei muito para entender isso.
Depois, o segundo passo: aprender a cuidar de mim, aprender o que é o autocuidado, sem me sentir egoísta. As mulheres da minha geração (Baby Boomers) receberam uma mensagem muito forte de que precisam se doar para serem amadas e respeitadas. Muitas vezes, cuidar excessivamente dos outros é fugir de si próprio. Só que se você não está bem, como pode cuidar do outro?
Cada vez que eu me cuido, eu me torno uma pessoa mais alinhada com minha essência, com quem verdadeiramente sou e me sinto mais feliz. E quanto mais alinhada estou com minha alma, com meu coração, mais energia positiva, mais amor vou irradiar e refletir para as pessoas com as quais convivo nos diferentes ambientes.
E por último, no meu caso, mais um passo neste caminho evolutivo que ainda não vivi profundamente, mas apenas parcialmente, que é aprender a ser cuidada.
Aprender a ser cuidada é desapegar totalmente do ego para exercitar a humildade, é aprender a deixar de lado o orgulho e permitir sentir-se frágil, dependente em vários momentos, a ser um paciente. O que é ser paciente? Pode ser exercitar a paciência para aceitar que o seu ritmo diminui, que a sua capacidade física enfraquece, que movimentos e atividades, que fazia com autonomia e facilidade, tornam-se difíceis. Aí aparece o maior desafio: aceitar a ajuda do outro, aceitar sentir-se dependente de outras pessoas. E nesta situação não há escolha, pois você depende desta ajuda para sobreviver.
Quando alguém sofre um acidente ou uma doença que o leva a essa situação prematuramente, esse terceiro passo do caminho evolutivo aparece antes. O envelhecer também nos leva a uma situação muito semelhante.
Portanto, em momentos cruciais que somos testados ou no final da vida, temos que aceitar a perda da força do corpo físico, mas não a da alma. É uma luta interna para entregar ou recuperar aos poucos a força física, sem perder a força espiritual. Acredito que esse é o passo mais difícil e, ao mesmo tempo, mais libertador. Só aprendemos quando descobrimos que podemos perder a força física, mas não a espiritual. A força física representa tudo que está fora, na aparência, tantas vezes excessivamente valorizada pela cultura ocidental. A força espiritual representa tudo que está dentro e que a cultura oriental cultiva e valoriza. É essa força espiritual, a força da alma, que levamos junto quando a vida acaba, pois ela representa a nossa evolução.
Finalizando esta reflexão: os três passos do caminho evolutivo podem aparecer de forma não-linear, em uma sequência diferente na vida de cada um de nós, mas sempre nos levam a uma evolução, que é a nossa missão de vida. Por isso, é chamado de CAMINHO EVOLUTIVO.